sexta-feira, maio 01, 2015

MINISTRO HENRIQUE NEVES, DO TSE, CONCEDE HABEAS CORPUS PREVENTIVO A THIAGO CALIL

Decisão prolatada pelo Ministro Henrique Neves, do Tribunal Superior Eleitoral, concede habeas corpus a Thiago Calil,  contra quem, há um decreto  de prisão preventiva do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro, acatando recurso do promotor Victor Queiroz, do Ministério Publico Eleitoral de Campos, por envolvimento na Operação Cinquentinha, que desvendou um esquema de compra de votos nas eleições municipais de 2008.

Abaixo o arrazoado e a decisão:

HABEAS CORPUS Nº 209-38.2015.6.00.0000 - CLASSE 16 - CAMPOS DOS GOYTACAZES - RIO DE JANEIRO

Relator: Ministro Henrique Neves da Silva

Paciente: Thiago Machado Calil

Advogado: José Olímpio dos Santos Siqueira

Órgão coator: Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus preventivo impetrado em favor de Thiago Machado Calil contra o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, que, dando provimento parcial ao recurso eleitoral interposto pelo Ministério Público nos autos do Processo-Crime nº 3769.2009.619.0100, determinou a sua imediata prisão preventiva.

O impetrante alega, em suma, que:

a) o Ministério Público Eleitoral ofereceu denúncia em que acusou o paciente de se associar em quadrilha, por ocasião do pleito de 2008, para prática do delito de corrupção eleitoral;

b) a ação penal foi julgada procedente pelo juízo eleitoral de primeiro grau, para reconhecer a prática, em continuidade delitiva, do delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral, com a aplicação da pena de 3 anos e 3 meses de reclusão e 11 

dias-multa no valor mínimo legal. Na ocasião, o juízo sentenciante afastou a constrição cautelar;

c) o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, em votação não unânime e com base no voto de um dos desembargadores, que foi tomado como voto médio, deu provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral, majorou a pena aplicada e determinou a sua custódia cautelar, por vislumbrar a situação prevista no art. 387, § 1º, do Código de Processo Penal;

d) nos termos do art. 5º, LXVI, da Constituição Federal e do art. 310 do Código de Processo Penal, o paciente deve aguardar o trâmite do processo em liberdade;

e) a constrição cautelar, que foi determinada com base na gravidade da conduta que supostamente lhe é atribuída, deve ser afastada, ante a primariedade do réu e a existência de endereço fixo;

f) segundo a jurisprudência dos tribunais pátrios, a prisão de natureza cautelar é medida excepcional, apenas admissível quando presentes os elementos descritos no art. 312 do Código de Processo Penal;

g) ¿o transcurso de mais de seis anos entre a data do delito até o presente momento demonstra a ausência de razoabilidade e proporcionalidade na sua decretação pelo Tribunal Regional Eleitoral" (fl. 10). 

Requer a concessão da ordem de habeas corpus para que seja revogada a prisão preventiva decretada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro.

Por meio do despacho de 16.4.2015 (fl. 56), determinei que fossem solicitadas informações do órgão apontado como coator.

O impetrante, às fls. 61-62, emendou a inicial e requereu a concessão de liminar, pois ¿pode ser preso a qualquer momento" (fl. 61).

No despacho de fl. 64, ante o pedido de apreciação imediata da liminar, entendi recomendável se aguardar a prestação de informações pelo órgão apontado como coator, por não vislumbrar nos autos nenhum elemento que esclarecesse os motivos da prisão preventiva.

O impetrante, às fls. 67-68, apontando a demora de mais de onze dias por parte da autoridade coatora para prestar a informações solicitadas por esta Corte Superior, reiterou o pedido de liminar para concessão da ordem.

Por meio da petição protocolada sob o nº 8.578/2015 (fl. 70), o impetrante juntou cópia do acórdão do TRE/RJ no qual se decretou a sua prisão preventiva.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, registro que, em 16.4.2015, solicitei informações ao órgão apontado como coator, as quais deveriam ser instruídas com cópia do acórdão proferido nos autos do Processo-Crime nº 3769.2009.619.0100, providência não atendida até a presente data.

Não obstante, verifico que o impetrante juntou aos autos cópia integral do referido aresto (fls. 70-149), de modo que se afigura viável a análise dos motivos da prisão preventiva e do pleito liminar.

Conforme relatado, o impetrante apresentou habeas corpus preventivo pleiteando que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro se abstivesse de cumprir a ordem de prisão preventiva decretada por ocasião do julgamento do recurso eleitoral no Processo-Crime nº 3769.2009.619.0100.

Aduz que a custódia cautelar não pode ser decretada exclusivamente com base na gravidade do delito e que, dado o transcurso do tempo em relação à data da suposta infração penal, não existiriam riscos à ordem pública ou à ordem econômica.

Destaco os fundamentos para a decretação da prisão preventiva, que constam do voto-vista proferido pelo eminente Desembargador Marco Couto (fl. 121):

[...]

Considerando que a ordem pública deve ser resguardada, considerando que os crimes praticados pelos réus demonstram que eles não têm o mínimo compromisso com o ordenamento jurídico, considerando que a prática delitiva de tal calibre deve ser firmemente combatida - até para que sirva de exemplo para os demais envolvidos no processo político -, considerando que os réus foram condenados em duas instâncias, considerando que não houve substituição das penas privativas de liberdade pelas penas restritivas de direitos e considerando que foi fixado o regime fechado, encaminho voto pela decretação da prisão preventiva dos réus Thiago Machado calil, Assis Gomes da Silva Neto e Núbia da Cunha Costa, para a garantia da ordem pública, com base no art. 312, caput, do CPP, com a consequente expedição dos respectivos mandados de prisão.

[...]

Ressalto, ademais, os fundamentos do voto do eminente Desembargador Fábio Uchôa no que diz respeito à decretação da prisão preventiva (fls. 123-124):

[...]

Com relação ao pedido de prisão preventiva, subscrevo todos os fundamentos trazidos pelo Desembargador Marco Couto e acrescento mais um. O Pacto de São José da Costa Rica - que, na verdade, é a Convenção Americana dos Direitos Humanos - é sempre ventilado por aqueles que se dizem garantistas e são citados a todo momento para justificar uma série de supostos direitos que os acusados teriam. Mas, o próprio Pacto estabelece, na parte que trata da presunção de inocência, que essa presunção tem vigência e aplicabilidade até prova em contrário.

Estamos aqui diante de uma ação penal na qual já foi produzida a prova em contrário, foi reconhecida pela sentença de Primeiro Grau e, agora, confirmada em Segunda Instância, indubitavelmente, a existência dessa prova. Portanto, resta afastada, totalmente, a presunção de inocência.

O que vem ocorrendo, na verdade, é uma interpretação equivocada do art. 5º da CRFB/88, quando se fala que a presunção de inocência deve prevalecer até o trânsito em julgado. Na verdade, a Constituição disse muito mais do que deveria ter dito ou queria dizer porque, na minha maneira de ver, aguardar-se o trânsito em julgado quando já se tem todas as provas é um verdadeiro disparate. Inclusive, é uma demonstração de instabilidade social fomentando linchamentos que temos visto reiteradamente pela cidade.

A sociedade, como um todo, espera do Poder Judiciário uma resposta penal adequada, e este fica protelando por dez ou quinze anos para produzir essa resposta. A sociedade não entende isso. E a criminalidade, consequentemente, sabedora disso, está aumentando também.

Assim, essa interpretação literal da Constituição Federal - quando ela diz mais do que deveria dizer - não tem como prevalecer. O que precisa ocorrer é uma interpretação sistemática da presunção de inocência com o próprio Pacto de São José da Costa Rica. Portanto, uma vez produzida a prova em contrário, está afastada a presunção de inocência e é perfeitamente factível o recolhimento daquele réu que já se sabe será condenado posteriormente.

[...]

Da leitura dos trechos supratranscritos, verifico, em uma análise perfunctória, própria das tutelas liminares, que a prisão preventiva do paciente foi decretada com base em elementos genéricos, atinentes à gravidade do delito, e como medida de antecipação da pena ¿daquele réu que já se sabe que será condenado posteriormente" (fl. 124).

Todavia, é orientação consolidada, tanto no plano doutrinário quanto no jurisprudencial, que a prisão preventiva, no regime constitucional de liberdades, é hipótese excepcional, subordinada à plena demonstração, com base em elementos concretos constantes dos autos, do fumus comissi delicti e do periculum libertatis.

Em outros termos, para a decretação da prisão preventiva, não basta que o órgão jurisdicional aluda ao desvalor da conduta, o qual já é considerado na própria delimitação do tipo penal pelo legislador. É essencial que se demonstre o risco ao próprio resultado do processo e da tutela penal, de modo que se justifique a privação temporária daquele que, nos termos da ordem constitucional vigente, é presumivelmente inocente.

Nesse sentido, toda prisão preventiva, para que se legitime, deve ter ares de instrumentalidade e de cautelaridade, com a demonstração inequívoca da necessidade e da proporcionalidade da medida.

Sobre o tema, cito as lições de Eugênio Pacelli:

[...]

E assim é porque o reconhecimento da situação jurídica de inocente (art. 5º, LVII) impõe a necessidade de fundamentação judicial para toda e qualquer privação da liberdade, posto que só o Judiciário poderá determinar a prisão de um inocente. E, mais, que essa fundamentação seja construída em bases cautelares, isto é, que a prisão seja decretada como acautelamento dos interesses da jurisdição penal, como marca da indispensabilidade e da necessidade da medida.

Em tempo, um esclarecimento que pode se revelar útil: toda prisão antes do trânsito em julgado deve ser considerada uma prisão provisória. Provisória unicamente no sentido de não se tratar de prisão-pena, ou seja, aquela decorrente de sentença penal condenatória passada em julgado, também chamada de prisão definitiva, embora se saiba que não existe prisão por tempo indeterminado (perpétua) no nosso ordenamento jurídico.

De outro lado, toda prisão anterior ao trânsito em julgado deve também ser considerada uma prisão cautelar. Cautelar o que se refere à sua função de instrumentalidade, de acautelamento de determinados e específicos interesses de ordem pública. Assim, a prisão que não decorra de sentença passada em julgado será, sempre, cautelar e também provisória. (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 3. ed. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, pp. 490-491, grifo nosso.)

[...] 

A jurisprudência desta Corte Superior se firmou no mesmo sentido, da excepcionalidade da decretação da prisão preventiva, conforme se vê nos julgados abaixo:

Prisão em flagrante. Constrangimento ilegal. Caracterização. Prisão com contornos de antecipação ilegal de pena. Precedentes. Liminar deferida. Concessão da ordem. 

É ilegal a prisão preventiva que, sem amparo na lei, constitui antecipação de pena eventual.

(HC nº 537, rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 8.8.2006.)

Ação Penal. Prisão preventiva.

Considerando a concessão de habeas corpus anterior por este Tribunal (HC nº 666) em favor dos mesmos pacientes, cuja prisão preventiva havia sido decretada com base em motivos idênticos aos agora objeto do novo decreto, não cabe repristinar os mesmos fundamentos genéricos de eventual gravidade dos delitos imputados aos pacientes, sem a indicação de motivos concretos e fatos contemporâneos, que atendam aos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal.

Ordem concedida.

(HC nº 4286-66, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 30.9.2011, grifo nosso.)

RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME DO ART. 72, III, DA LEI Nº 9.504/97. QUEBRA DE URNA ELETRÔNICA. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONVERSÃO EM PREVENTIVA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. INCIDÊNCIA AOS CASOS EXCEPCIONAIS. POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. ART. 319 DO CPP. RECURSO PROVIDO PARA CONCEDER A ORDEM.

1. Segundo a assente jurisprudência do STJ, "a prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão devidamente fundamentada, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos dos arts. 312 e seguintes do Código de Processo Penal" (STJ-HC nº 262.775/SP, Sexta Turma, DJe de 16.5.2013, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior).

2. A constrição cautelar, por ser medida extraordinária e excepcional, deve estar subordinada a parâmetros de legalidade estrita e aos princípios da presunção da inocência, do devido processo legal e da proporcionalidade, sendo inviável sua adoção como punição antecipada.

3. A gravidade da conduta, diante da pena cominada ao crime, a ausência de emprego fixo, a dificuldade de localização da residência do acusado e a instauração de inquéritos policiais por fatos ocorridos há mais de 10 anos, sem condenação, não autorizam a segregação cautelar.

4. Levando-se em conta o princípio da excepcionalidade da prisão preventiva; o disposto no art. 319 do Código Penal, que prevê outras custódias cautelares diversas da prisão; o excesso de prazo da prisão preventiva aplicada; e a dúvida quanto à integridade mental do acusado, há de se acolher a pretensão recursal.

5. Recurso ordinário provido para conceder a ordem e determinar ao juízo de origem que substitua a prisão preventiva por uma ou mais medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, que entenda aplicáveis ao paciente.

(RHC nº 742-76, rel. Min. Marco Aurélio, redator para o acórdão Min. Dias Toffoli, DJE de 6.9.2013, grifo nosso.) 

Tal entendimento também é consagrado no Supremo Tribunal Federal, consoante se vê dos julgados adiante indicados:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. DELITO DE ROUBO. PRISÃO CAUTELAR BASEADA NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO E NA PRESUNÇÃO DE INTERFERÊNCIA NA INSTRUÇÃO CRIMINAL. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. 

1. Segundo o art. 312 do Código de Processo Penal, a preventiva poderá ser decretada quando houver prova da existência do crime (materialidade) e indício suficiente de autoria, mais a demonstração de um elemento variável: (a) garantia da ordem pública; ou (b) garantia da ordem econômica; ou (c) por conveniência da instrução criminal; ou (d) para assegurar a aplicação da lei penal. Para qualquer dessas hipóteses, é imperiosa a demonstração concreta e objetiva de que tais pressupostos incidem na espécie, assim como deve ser insuficiente o cabimento de outras medidas cautelares, nos termos do art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal. 

2. O decreto prisional não descreve, com base em informações concretas, a necessidade de resguardar a ordem pública, não sendo suficiente, para esse fim, a invocação da gravidade abstrata do delito. Precedentes. 

3. As afirmações de possibilidade de reiteração delitiva e de interferência na instrução criminal não estão apoiadas em nenhum elemento dos autos, tratando-se, portanto, de meras presunções, o que é rechaçado categoricamente pela jurisprudência desta Corte. 4. Ordem concedida para revogar a prisão preventiva imposta ao paciente, ressalvada a hipótese de o juízo competente impor, considerando as circunstâncias de fato e as condições pessoais do paciente, medidas cautelares diversas da prisão previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. Ordem estendida aos demais corréus, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal.

(HC nº 126.846, rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJE de 6.4.2015, grifo nosso.)

"HABEAS CORPUS" - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA COM APOIO NA GRAVIDADE OBJETIVA DO DELITO - FUNDAMENTO INSUFICIENTE QUE, POR SI SÓ, NÃO AUTORIZA A DECRETAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR - INDISPENSABILIDADE DA VERIFICAÇÃO CONCRETA DE RAZÕES DE NECESSIDADE SUBJACENTES À UTILIZAÇÃO, PELO ESTADO, DESSA MEDIDA EXTRAORDINÁRIA - DECRETABILIDADE DA PRISÃO CAUTELAR - POSSIBILIDADE, DESDE QUE SATISFEITOS OS REQUISITOS MENCIONADOS NO ART. 312 DO CPP - SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA IDÔNEA - CONSIDERAÇÃO, PELO MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU, DE QUE A SUPOSTA EXISTÊNCIA DE PROCESSO PENAL EM CURSO LEGITIMA A UTILIZAÇÃO, CONTRA A PACIENTE, DA MEDIDA EXCEPCIONAL DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE - INADMISSIBILIDADE - INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADO - "HABEAS CORPUS" DEFERIDO. PRISÃO CAUTELAR - CARÁTER EXCEPCIONAL. - A privação cautelar da liberdade individual - cuja decretação resulta possível em virtude de expressa cláusula inscrita no próprio texto da Constituição da República (CF, art. 5º, LXI), não conflitando, por isso mesmo, com a presunção constitucional de inocência (CF, art. 5º, LVII) - reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser ordenada, por tal razão, em situações de absoluta e real necessidade. A prisão processual, para 

legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu. Doutrina. Precedentes. A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU DO RÉU. - A prisão cautelar não pode - nem deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão cautelar - que não deve ser confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal. Precedentes. A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - A natureza da infração penal não constitui, só por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado. Precedentes. A PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE COMO SE CULPADO FOSSE AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL. - A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, 

art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém, absolutamente ninguém, pode ser tratado como culpado, qualquer que seja o ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional do estado de inocência, tal como delineado em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. Precedentes. SITUAÇÕES JURÍDICO-PROCESSUAIS AINDA NÃO DEFINIDAS POR DECISÃO IRRECORRÍVEL DO PODER JUDICIÁRIO NÃO PODEM REPERCUTIR EM DESFAVOR DO RÉU. - A mera sujeição de alguém a simples investigações policiais (arquivadas ou não) ou a persecuções criminais ainda em curso não basta, só por si - ante a inexistência, em tais situações, de condenação penal transitada em julgado -, para justificar o reconhecimento de que o réu não possui bons antecedentes ou, então, para legitimar a imposição de sanções mais gravosas, como a decretação de prisão cautelar, ou a denegação de benefícios de ordem legal. Somente a condenação penal transitada em julgado pode justificar a adoção, contra o indiciado, réu ou sentenciado, de medidas restritivas de direitos, inclusive no âmbito processual, pois, com o trânsito em julgado, descaracteriza-se a presunção "juris tantum" de inocência do réu, que passa, então, a ostentar o "status" jurídico-penal de condenado, com todas as conseqüências legais daí decorrentes. Precedentes.

(HC nº 105.556, rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJE de 30.8.2013, grifo nosso.)

Em face de tal orientação e em análise preliminar, entendo não estar evidenciada a necessidade e indispensabilidade da prisão preventiva para a garantia da ordem pública, e, no mais, considero acertadas as ponderações do eminente Desembargador Flávio Willeman (fl. 124):

[...]

Estava ponderando aqui com a Desembargadora Ana Tereza Basílio. É preciso que haja um perigo ao pleito eleitoral, mas nenhum se avizinhando nesse momento. Não vejo aqui um perigo demonstrado, com todas as vênias à divergência, para se decretar a preventiva agora, neste caso, por fatos ocorridos há mais de cinco anos sem que se tenha um pleito eleitoral que se avizinhe para justificar-se tal restrição à liberdade dos réus.

[...]

Por essas razões, nos termos do art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, defiro a liminar pleiteada, a fim de conceder salvo conduto em favor de Thiago Machado Calil, determinando ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro que se abstenha de cumprir, em relação ao paciente, a prisão preventiva decretada no julgamento do Recurso Criminal nº 3769.2009.619.0100.


Reitero o pedido de fl. 56, fixando o prazo de dez dias para que a referida Corte preste as informações e junte os documentos que entender necessários.

Apresentadas as informações ou vencido o respectivo prazo, abra-se vista à Procuradoria-Geral Eleitoral. 

Comunique-se, com urgência, ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro.

Publique-se.

Intime-se.

Brasília, 30 de abril de 2015.

Ministro Henrique Neves da Silva

Relator

2 comentários:

  1. DIZ O DITADO:
    QUEM TEM MADRINHA, NÃO MORRE PAGÃO !!??!!??

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  2. Que descrença das instituições...
    Estão podres.

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