A propósito da ação do Ministério Público Federal, que flagrou trabalho escravo no corte da cana, em Campos, achei conveniente postar essa poesia escrita em 1989.
PRIMEIRA ESTAÇÃO
Meio mar,
O canavial clareia sob a manhã nascida.
Ali o tempo não anda,
Não aboliram a escravatura,
Não proclamaram a República.
Imperial, a plantação atravessa o século,
Impunemente.
SEGUNDA ESTAÇÃO
Eles formam duas fileiras
Na carroceria do caminhão.
Vão ombro a ombro
E vistos assim, mansos cordeiros de Deus,
Nem parecem ser os que sustentam
A Usina e seus domínios,
A mesa farta, baronal
Da casa grande.
TERCEIRA ESTAÇÃO
São homens e mulheres como nós:
Carne,
Ossos
E sonhos.
Diferem, apenas, na força.
Aprenderam com a fome
Que a vida tem seus protegidos
E que o resto é luta.
Como milagreiros
Transformam cana em açúcar,
Longe do lucro
E da lei.
QUARTA ESTAÇÃO
As mulheres do canavial
Tem o olhar limpo
Como a luz do dia.
Algumas trazem atrás de si
Seus anjos encardidos.
São todas fortes e férteis
Como a terra.
Acreditam na grande colheita da Justiça, um dia.
Enquanto isso
Lavram o sonho.
QUINTA ESTAÇÃO
Os homens esperam o milagre dos pães
E dos peixes que demora tanto.
Conhecem a comida fria
Defendida dia a dia à catana e facão.
O que não foi possível ainda
É saciar a sua imensa
Sede de Justiça.
SEXTA ESTAÇÃO
O fogo arma sua tenda incandescente
Sobre o canavial.
Pardais assustados
Flecham no horizonte vermelho.
A tarde arde na planície.
Subterrânea, a soca resiste
E promete vingar-se.
Fará erguer do chão de cinzas
O facho verde
Da vida.
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