segunda-feira, fevereiro 05, 2018

ENTREVISTA CONCEDIDA AO JORNAL TERCEIRA VIA

Jornal Terceira Via



Entrevista: jornalista, radialista e blogueiro; os quintais de Fernando Leite

Jornalista foi homenageado no bloco carnavalesco "Abre Aspas" e fala um pouco de outros carnavais da sua vida

CAMPOS 
POR COLUNA DO BALBI
 
5 DE FEVEREIRO DE 2018 - 0h01
Ele foi um dos radialistas e jornalistas mais respeitados e prestigiados de sua geração. O que falava e o que escrevia mostrava um ser humano pleno, tanto que acabou eleito deputado estadual pelo PDT de Brizola. Dono de uma integridade inox, Fernando nunca enferruja. Radialista e jornalista, era o melhor declamador de seus poemas cuja modéstia o faz definí-los como razoáveis quando, na verdade, são ótimos. Nesta entrevista, ele falou de tudo, inclusive do fato de ser parkisoniano há cinco anos. Falou de cultura, de literatura e de uma força tão estranha como tamanha que o leva a nunca parar. Querido por todos os amigos, esse ano ele foi homenageado pelo bloco carnavalesco de jornalistas “Entre aspas”. Perguntado sobre a nova geração, Fernando disse que não gosta de dar conselhos. É verdade: ele dá exemplos.
Você, por muito tempo, foi figura de ponta no jornalismo tanto impresso quanto radiofônico. Você se considera mais jornalista ou radialista embora há quem diga que as duas coisas se confundam?
Eu me considero mais radialista. A opção pelo jornalismo, na verdade, deveu-se a sua proximidade com a literatura, que é a minha grande paixão e grande teimosia. Pessoalmente, acho que embora sejam atividades correlatas, o rádio exige mais agilidade, cuidado com o linguajar, fluência verbal; o jornal, para mim, é mais calmo, te dá a chance de elaborar a frase. No rádio, falou, já era.
Então você gosta mais de rádio do que de jornal?
Gosto. E digo mais, gosto do Rádio AM, aquele que acorda os trabalhadores rural e urbano; aquele que manda abraço, que promove encontro de solitários, de show de calouros. Eu tenho a alma cafona. Gosto de estabelecer intimidade com o ouvinte, fazer amizade, discutir democraticamente os assuntos pertinentes, abrir o microfone para o povo reclamar, pressionar as autoridades, informar as condições da cidade, fazer campanhas comunitárias, prestar serviço. Eu sou dessa geração de comunicadores, sou aluno de Luiz Cândido Tinoco, Andral Tavares, Talvane Coutinho, Amaro Lírio, Josélio Rocha, Ângelo Marcos, Cacau Borges, Jorge Teles e outros tantos. Mas, digo sempre que nós, radialistas com este perfil, somos “animais em extinção”.
E o Blog?
O Blog é a janela virtual do mundo moderno. No meu caso, foi uma alternativa para continuar vivo. Tive que me afastar dos meios de comunicação e se não fosse, o recurso do Blog eu não sei o que seria de mim. E eu faço um Blog como fazia meu programa de rádio, um espaço aberto ao debate público, um instrumento de denúncia, eu chamo de “quitanda”. Lá você encontra tudo, abacaxi, manga, laranja, jiló. O que norteia o caminho do Blog é o gosto do freguês.
Você, entre as muitas facetas, acabou enveredando também pela política, se elegendo deputado estadual. Que lição você tirou disso?
A Política é indispensável, é a via pacífica de evolução da sociedade. A sociedade muda pelo voto ou pela bala. Mas, a política do tempo presente apodreceu; o modelo apodreceu, necrosou. A atividade política foi transformada em ação criminosa, nós vivemos sob a égide dos “podres poderes” como canta Caetano. As instituições, todas, vivem uma realidade completamente diferente da que vive o brasileiro comum. Nossas autoridades habitam o “Olimpo”. O Congresso dá o verniz de legalidade nas maiores e mais catingosas imoralidades e o povo morre de febre amarela, é atendido em corredor de hospital, a educação deforma as gerações e “bumba meu boi”. O modelo corrompe. Veja você, o juiz Bretas, notório magistrado, fiel depositário da esperança da sociedade requereu ajuda moradia e justificou que é “legal”. É o que eu estou falando é o modelo. Você não passa pelo brejo sem sujar os pés.
Fernando, você era daquela turma que tinha mais afinidade com Garotinho e acho que foi o primeiro a romper. Como foi isso?
Eu não tenho mais nenhuma relação, de nenhuma ordem com o Garotinho e quero que continue assim. Não quero falar dele.
Mudando de assunto: a poesia. O Fernando continua poeta?
Eu sigo o que ensinou o mestre Ariano Suassuna, leio e escrevo todo dia. É raro o dia em que eu não faço uma poesia. Estou com acervo para uns 3 livros. Um livro está pronto para edição, “Testamento de Vento”, tenho também um projeto de adaptação de um romance que escrevi, Ventos de Agosto, para o teatro. Espero finalizá-lo até março e convidar elenco e direção para voltar ao teatro.
Inevitável perguntar como você está enfrentando o seu problema de saúde?
Eu estou parkisoniano, há 5, 6 anos. A doença veio associada a uma depressão brutal. Fiquei 3 anos sem sair de casa, cheguei a ficar meses sem ir ao meu quintal. O assassino que veio me matar chegou e convive comigo, diariamente. Mas, não vou deixar as coisas fáceis para ele não. Aos poucos venho aprendendo a enfrentá-lo e tenho aprendido muito. Hoje tenho algumas limitações motoras e sinto na carne o que as pessoas com maiores ou menores limitações sofrem nas ruas das cidades. Como diz Nietzsch, “o que não me mata, me fortalece”. Era mais fácil antes, agora é mais difícil, mas só para quando for impossível.
Alguma coisa que você não fez e quer fazer?
Muitas. Ainda quero mudar o mundo. Estou recomeçando pela minha aldeia, não é assim? Acho que Campos pode ser a melhor cidade do mundo pra se viver. Somos uma planície solar, com campo, mar, água doce, capital científico, falta juízo para se estabelecer um pacto político e trabalhar. A recuperação da cidade exige este desprendimento de todos. Quem quiser cuidar do seu umbigo fica de fora, quem quiser fazer política para se vingar, ou para brigar, fica longe. A missão é para gente de boa vontade.
Como você avalia a questão da cultura em Campos?
A definição antropológica de cultura é tudo aquilo que o homem faz. Cultura é tudo e tudo é cultura. O Poder não faz cultura, quem faz cultura é o povo. E quando o povo faz cultura as coisas acontecem. Eu e você, Balbi, somos da mesma geração, fizemos cultura a vida inteira, cada qual com seu estilo. Se não tem teatro, encena na rua; acho deprimente o artista ficar na antessala do Poder aguardando verba. Se tiver dinheiro bem, se não tiver amém. Eu não vou deixar de criar por causa disso. O artista não é o bobo da corte. O Poder não tem ideia do tamanho da cultura. Você sabe o nome de um gestor que tenha vivido 500 anos atrás? É difícil, mas sabe o nome do autor de Dom Quixote.
Você é tímido por natureza e não gosta muito de adjetivos ou superlativos. Não se considera contrariando muitos um grande poeta, mas seu irmão que já passou é considerado um dos maiores poetas fluminense. Saudades dele?
Meu Deus! Quanta saudade! Para além do Poeta que ele é, era a pessoa mais desprendida que eu já conheci na minha vida. Ele ficou no lugar do meu pai, que morreu quando eu tinha 6 anos. Roberto deixou os melhores exemplos e deixou uma obra extraordinária. Ele era um parnasiano com conteúdo. Suas poesias eram simples e belas por dentro e por fora.
Como você enxerga a nova geração, a que estão no poder ou fora dele?
Eu estou na arquibancada e tenho observado o time em campo. Não dou conselhos porque não tenho estofo para isso. Mais perdi do que ganhei. Mas vejo o surgimento de lideranças vocacionadas. Lamentavelmente, o debate político, aqui, é muito raso. Falta leitura, falta humildade para aprender sempre e, pior, equivocadamente, se instaurou uma discussão baldia que coloca em cantos separados quem é jovem e quem não é. Isso é segregação pura. Em Política, como de resto, na vida, não se deve medir os outros pela idade. O velho Ulisses Guimarães quando foi chamado de “velho” por Collor de Melo, respondeu: – “sou velho, mas não sou velhaco!”

Um comentário:

  1. HOMENAGEM MUITO JUSTA AO VÔ DA NINA E DO MIGUEL. Tenho orgulho em dizer que convivi e aprendi muito com os FILHOS DE D.DEJA -ANTÔNIO, FERNANDO E GUILHERME- A limitação física jamais substabelecerá a sua capacidade mental. Por isso, ainda acredito que, um dia, votarei em você para Prefeito de Campos.
    VALDEBRANDO SILVA JR.

    ResponderExcluir

Deixe sua opinião