FILHOS DA
PÁTRIA
Corre uma
provocação bem humorada, segundo a qual, a Associação Nacional das Putas, com
sede em Brasília, expediu um comunicado indignado, esclarecendo de forma
peremptória, que os políticos que andam fazendo lambança por aí, não são seus
filhos, embora assim sejam chamados. As incansáveis operadoras do sexo não
aguentam mais serem acusadas de terem parido figuras tão execráveis e
acrescentam: “quem pariu Mateus que o balance”.
Do humor ao horror. A sociedade brasileira revela-se perplexa
com tantos escândalos protagonizados pelas elites dirigentes. Somente a delação
dos executivos da Odebrecht, conhecida como “delação do fim do mundo”, arrasta
mais de 200 medalhões para o banco dos réus, isso sem contabilizar as
infindáveis operações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.
Mas
engana-se quem pensa que isto é novo. E ilude-se quem atribui comportamento social tão delinquente
aos que vivem abaixo da linha do Equador, nas caricatas republiquetas de
bananas, sob argumento da influência do clima. A corrupção é um traço da
personalidade humana e viceja como ervas daninhas quando encontra ambientes
favoráveis. O Poder é um campo estercado.
É cultural.
E por mais constrangedor e incômodo que seja admitir, “eles somos nós”.
Por isso vamos ficar com o recorte do Brasil contemporâneo,
visto que logo ali no século 19, o jurista e intelectual, Ruy Barbosa, já
reclamava: “De
tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver
crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser
honesto.”
De lá para cá, avançamos, desgraçadamente, para o refinamento
da pilhagem pública, da rapinagem oficial. O tesouro nacional passou a bancar
fortunas pessoais inimagináveis, tão grandes que não cabem no sistema
financeiro nacional. São repartidas em paraísos fiscais. A bolsa da Viúva
serviu de caixa para financiamento criminoso de campanhas político-partidárias.
Todos sabem disso e uma observação mais acurada irá revelar que há os que
condenam a tunga, mas há, e não são poucos, os que a “justificam” e queriam
estar no lugar dos que levaram o botim.
O Brasil é cenário do maior caso de corrupção oficial do
Planeta. É campeão! Isso não é fortuito. Há ambiente para o crime.
A sociedade, diante de realidade tão áspera, faz apressados
julgamentos superficiais. A condenação moral dos envolvidos é rala porque, não
há como negar: os políticos, todos, inclusive a ínfima parcela que se comporta
dignamente, são gestados pela sociedade, que se escandaliza, nos telejornais da
noite, quando vê seus filhos bastardos na caçapa do camburão, mas “leva sua
vida em agonia e maltrata, por dinheiro”, o espaço coletivo, na vã ilusão que
bandidos são só os que vemos na tela da TV.
Repito, é cultural. As gerações se sucedem e o múnus público
se deteriora velozmente. Ninguém espere nada destes que estão aí. Gesto de grandeza
e exaustão políticas como a de Getúlio, que pôs fim a própria vida por não
suportar a desonra que lhe imputavam é impensável para os protagonistas da
caudalosa roubalheira. Guimarães Rosa dizia que só havia duas maneiras de se
ficar rico: ou no garimpo ou no jogo. Agora, há a política que pari
milionários, Rosa.
Os Poderes, sob os quais, nos curvamos em obrigações, são
espelho que refletem nosso rosto, por mais que isso nos incomode. Melhor
metáfora para a relação da sociedade com seus políticos é a obra clássica de
Oscar Wilde, “O retrato de Dorian Grey”. Enquanto a personagem, seduzida pela
perfídia, mantém-se íntegra fisicamente, nos salões elegantes do grand monde, seu
retrato na parede exibe a corrosão ácida da corrupção. Se é que isso é
conforto, pelo menos, ninguém escapa, impunemente.
A piada da Associação das putas precisa mesmo ser corrigida:
eles não são filhos delas, são filhos da Pátria.
(FLF)
(artigo postado no Blog Opiniões)
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