A presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, homologou as 77 delações
de executivos e ex-executivos da construtora Odebrecht. A homologação dá
validade jurídica às delações.
Com a decisão
da ministra, o material foi encaminhado para a Procuradoria-Geral da República
(PGR), que vai analisar os documentos para decidir sobre quais pontos irá pedir
abertura de investigação.
De acordo com a
assessoria de imprensa do STF, o conteúdo das delações continua sob segredo de
Justiça. O sigilo só deverá ser derrubado após a abertura de investigação sobre
os fatos informados pelos delatores (veja ao final desta reportagem
os próximos passos da operação no tribunal).
Plantonista do
STF no recesso do Judiciário, Cármen Lúcia usou a prerrogativa de presidente
para homologar as delações dos dirigentes e ex-dirigentes da empreiteira.
Ela tomou a
decisão para não atrasar o andamento das investigações da Lava Jato, na medida
em que o relator do caso no tribunal, ministro Teori Zavascki, morreu em um
acidente aéreo no litoral do Rio de Janeiro.
Veja imagens de Cármen Lúcia
trabalhando no fim de semana em seu gabinete no STF para analisar os últimos
detalhes das delações dos dirigentes da Odebrecht
Após a morte de
Teori, a presidente do STF autorizou que os juízes auxiliares que
assessoravam o relator da Lava Jato concluíssem os trabalhos.
Cármen Lúcia
passou o fim de semana trabalhando em seu gabinete para analisar os últimos
detalhes das delações antes de homologar os depoimentos (assista ao vídeo acima).
Na sexta-feira
(27), os juízes auxiliares do gabinete de Teori haviam concluído as audiências
com os 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht que fecharam acordo no âmbito
da Operação Lava Jato.
Nas audiências
com os delatores da empreiteira, os juízes perguntaram se as informações foram
prestadas nos depoimentos de livre e espontânea vontade, sem coação por parte
dos investigadores.
Um dos últimos
delatores ouvidos no trabalho de checagem das delações foi o ex-presidente e
principal herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht, que participou da audiência no
presídio onde está, em Curitiba (PR) .
O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, só pediu ao STF para homologar as
delações. Ao contrário do que fez em outros casos, não pediu neste momento para
separar o conteúdo em diversos pedaços e remeter as partes sobre quem não tem
foro privilegiado para outras instâncias.
Por isso, a
remessa para outros tribunais das informações sobre quem não tem foro deve ser
feita em um momento posterior, quando Janot pedir ao STF abertura de inquéritos
ou inclusão de dados em investigações já em andamento.
O que
acontece agora
·
Os trechos das
delações que não envolvem de alguma forma autoridades com foro privilegiado vão
para outras instâncias (o que for relacionado à Petrobras vai para o juiz
federal Sérgio Moro e outros temas para juízes federais ou estaduais pelo país
a depender da suspeita e de quem envolva). Prefeitos e deputados estaduais têm
foro nos Tribunais de Justiça ou nos Tribunais Regionais Federais; governadores
têm foro no Superior Tribunal de Justiça. No STF ficam deputados federais,
senadores, ministros e presidente da República.
·
O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, vai avaliar as delações sobre
pessoas com foro para decidir sobre o que pedirá abertura de inquérito e quais
trechos pretende arquivar. Ele pode ainda incluir trechos em inquéritos já em
andamento. Não tem prazo para isso, mas em outros casos levou em média dois
meses.
·
O sigilo cai,
em tese, quando todo o teor da delação for usada nos inquéritos. Por isso é
possível que alguns trechos sejam utilizados em inquéritos que não correm em
segredo e que o sigilo de cada delação vá caindo aos poucos. A delação da
Andrade Gutierrez, homologada em abril de 2016, segue em sigilo até hoje, mas
alguns trechos foram tornados públicos. Outras delações perderam o segredo em
menos tempo, dois a três meses depois da homologação.
Sigilo
Assim que foi
noticiada a homologação das delações, o presidente nacional da Ordem dos
Advogados do Brasil, Cláudio Lamachia, escreveu em sua conta no Twitter que
defende a quebra do sigilo do conteúdo do material.
"Defendo a
quebra do sigilo. É preciso que fique claro a toda sociedade o papel de cada um
dos envolvidos. A luz do sol é o melhor detergente", escreveu o presidente
da OAB.
Escolha
do novo relator
Outra decisão
importante que deve ser tomada por Cármen Lúcia nos próximos dias é sobre a
escolha do novo relator da Lava Jato no tribunal. Os processos da operação
envolvem dezenas de políticos, lobistas e empresários investigados no esquema
de corrupção que atuava na Petrobras.
Teori
concentrava a supervisão das investigações, tocadas por Ministério Público e
Polícia Federal. A importância do novo relator, bem como o critério pelo qual
será designado, se relaciona à sua responsabilidade no curso dos inquéritos e
ações penais contra os parlamentares.
A expectativa é
de que a decisão sobre quem será o novo relator da Lava Jato ocorra nesta
semana, quando o STF volta do recesso.
Uma das
possibilidades mais consideradas ultimamente é o sorteio entre os outros atuais
ministros da Corte.
Segundo o
Regimento do STF, caberia à presidente do STF determinar a redistribuição “em
caráter excepcional”, sem especificar em que situações concretas isso ocorrerá.
Mesmo nessa
hipótese, abrem-se pelo menos duas possibilidades no STF, dependendo de quem
poderá participar do sorteio: se os cinco ministros da Segunda Turma (à qual
pertencia Teori e onde são analisados os processos da Lava Jato) ou todos os 10
ministros que compõem o plenário aptos a relatar o caso (como presidente,
Cármen Lúcia fica fora de qualquer relatoria).
Integram a
Segunda Turma os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e
Celso de Mello.
Pré-delações
Ainda na etapa
em que os delatores prestavam informações para o Ministério Público e
aguardavam a assinatura dos acordos de delação premiada, alguns depoimentos
vazaram e se tornaram de conhecimento público.
Um deles era o
do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho. Ele
apresentou valores repassados a políticos com a finalidade de obter vantagens
para a empreiteira. Melo Filho citou citou 51 políticos de 11 partidos.
Segundo o
ex-executivo parte dos recursos foi paga por meio de doações eleitorais
oficiais, mas também há registro de propina e de caixa 2.
Também foi
vazado o depoimento de Paulo Cesena, ex-presidente da
Odebrecht Transport. Ele mencionou doações da empresa no valor de R$ 14 milhões
para o ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD);
de R$ 4 milhões para o secretário do Programa de Parceria de Investimentos,
Moreira Franco (PMDB); e de R$ 4,6 milhões para o ex-presidente da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB).
Na época,
Kassab divulgou nota na qual recomendou cautela com afirmações feitas por
delatores e afirmou que não tem conhecimento de doação à sua campanha feita
fora da lei.
Também em nota,
Moreira Franco havia dito que todos os atos que praticou como ministro da
Aviação Civil (período abordado na delação) estão “de acordo com as leis e as
normas brasileiras de aviação”.
Quando o
conteúdo da pré-delação veio à tona, os advogados de Cunha, que está preso em
Curitiba, não quiseram comentar as denúncias.
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