domingo, novembro 23, 2014

"ESTUPRO" BILIONÁRIO

Mais uma vez, o incansável, Renato Arêas, arquiteto urbanístico, traz valiosa colaboração ao Blog e à análise crítica da sociedade. Desta vez, Renato, demonstra com alentada pesquisa e números irrefutáveis que as contas públicas de Campos foram vítimas de um estupro, ante o silêncio obsequioso da Câmara de Vereadores.

Leia o texto:

Embora possa parecer estarrecedor, é exatamente o "estupro"  - prática não-consensual ..., imposto por meio de violência..., nestes termos devemos entender -  que ocorre em relação às contas públicas no município de Campos dos Goytacazes, que está contextualizado nas aplicações em obras que apresentam problemas, como por exemplo as do Programa Morar Feliz R$ 347 milhões - http://www.campos.rj.gov.br/exibirNoticia.php?id_noticia=1456 - (casas com rachaduras, que incendeiam por curto-circuito e que não possuem 01(um) metro quadrado de área verde/lazer/comunitária, além, das obras relacionadas ao patrimônio arquitetônico histórico, como o caso do Parque Alzira Vargas e do Mercado Municipal, sendo a primeira na ordem de mais de 16 milhões de reais e a segunda, inicialmente na casa dos R$ 10 milhões de reais. 

Como se não bastasse, estão as infelizes e irresponsáveis intervenções relacionadas à mobilidade urbana, onde as ciclofaixas, por exemplo, estão demarcadas com medidas irregulares, 50% inferiores ao que determina a normativa do CONTRAN (Resolução 236), a despeito de ter sido contratada para Consultoria em Engenharia de Transportes, pelo IMTT, através da Concorrência Pública 001/2014, conforme o Diário Oficial de 29 de Maio de 2014, a empresa TECTRAN, por R$ 2.791.845,57, quase R$ 3 milhões de reais.

Portanto, até o momento, temos: R$ 347 + R$ 16 + R$ 10 + 2,7 milhões = R$ 375,7 milhões de reais. Mas a conta não se esgota aqui, temos ainda de considerar o suposto sumiço dos R$ 600 milhões de reais e ainda a liberação prematura, irresponsável e sem conhecimento de causa, por parte da maioria da Câmara de Vereadores  - não participaram do Seminário "Mobilidade Urbana em Campos dos Goytacazes: uma agenda urgente" (realizado pelo Observatório Social de Campos, em 11/2013), além da falta de participação e interesse no debate da Sessão sobre Mobilidade Urbana, de 10 de Junho de 2014, promovido pelo Vereador Fred Machado - apenas quatro vereadores presentes: Fred Machado, Rafael Diniz, Paulo Hirano e Auxiliadora Freitas. Também, pela falta de trabalhos da Comissão de Transportes, presidida pelo vereador José Carlos - , assim, soma-se R$ 439 milhões para o aeromóvel, que sequer saiu do papel e que a cada momento de tímida divulgação  http://blogfernandoleite.blogspot.com.br/search?q=aerom%C3%B3vel apresenta totalização do percurso menor, sendo em um primeiro momento de 11 km - http://www.estouprocurandooquefazer.com/2013/05/rosinha-publica-decreto-para.html - e em um segundo momento 6,6 km, com a alegação "inocente" de que somente agora foi verificada a "necessidade permanente de via dupla para percorrer dois veículos (um de ida e outro de volta)..." - Jornal Folha da Manhã de 16/11/2014. Totalizadoaté o momento, desapropriação de 24.837,09m2, segundo o Decreto 114/2013, a serem suportadas pelos recursos dos Royalties do Petróleo (anexo). 

Assim, o "estupro", pela falta de consenso, torna-se bilionário, formado pelas somas: R$ 357,7 + R$ 600 + R$ 439 = R$ 1.396,7 BILHÕES DE REAIS!!

O aeromóvel, é bom que seja dito, existe em apenas dois lugares no mundo, sendo o primeiro em um parque temático em Jacarta, na Ilha de Java, na Indonésia; o segundo local, é na cidade de Porto Alegre/RS, em trecho de 814m, da Estação Aeroporto do Metrô ao Terminal 1 do Aeroporto Internacional Salgado Filho - http://www.trensurb.gov.br/paginas/galeria_projetos_detalhes.php?codigo_sitemap=87. Não estamos discutindo a tecnologia, que apesar de inovadora, pode ser problemática em um segundo momento visto a restrição da livre concorrência na manutenção do sistema, pois é de know-how "exclusivo" por quem detém o conhecimento e o desenvolvimento do sistema/tecnologia, inviabilizando a economicidade pela falta de concorrência pública. Estamos tratando da aplicação no ambiente urbano, e como em ambos os exemplos não há esta ambiência de forma plena - o caso de Porto Alegre possui insignificantes 814 metros e nenhuma relação intermodal urbana ! - o modal representa opção futura de médio e longo prazos, devendo ser entendido ainda, que nenhum modal, seja ele qual for, irá resolver isoladamente os graves problemas da mobilidade urbana em Campos dos Goytacazes, que não possui qualquer planejamento, ignora os preceitos do Plano Diretor Participativo e não há quaisquer movimentos para a realização de Audiências Públicas e para a elaboração do Plano de Mobilidade Urbana de Campos, contrariando a Lei 12587/2012, Art. 24, 3º, que define o prazo final em Abril de 2015, sob a pena de o município ser preterido de obter recursos federais para a aplicação em infra-estrutura de mobilidade urbana, caso que amplia absurdamente a incompetência da gestão municipal, pois comprometerá, inclusive, o aeromóvel - apesar de inviável em meu ponto de vista - pois este, conforme divulgações seria realizado por verbas do PAC 2 e não do IPTU!

Visto isso, seguem mais razões para que o projeto do aeromóvel, conforme proposto, seja visto como uma piada de mau gosto, um devaneio:

1- O local de implantação, Av.28 de Março, é um dos corredores viários de maior registro de acidentes, inclusive com vários casos de morte;

2- A largura da Av. 28 de Março, possui desalinhamento ao longo do seu trecho, com inúmeros imóveis edificados no alinhamento frontal dos terrenos;

3- Diante da necessidade de implantação de duas vias em sentidos opostos, há apenas duas formas de realizá-las, sendo a primeira por sobreposição, um acima e outro abaixo o que iria atingir mais de 10,00m de altura; a segunda possibilidade, seria de forma paralela, ou seja, um trem ao lado do outro, o que representaria projeção de parte dos trens sobre a pista de rolagem da Av. 28 de Março, devido ao canteiro central não possuir mais do que 2,50m. Em ambos os casos, haverá perda da paisagem urbana, com irretocável comprometimento do horizonte e cenários urbanos, havendo ainda perda da privacidade de todos os imóveis ao longo da via, especialmente os residenciais;

4- Não há qualquer plano apresentado que demonstre a viabilidade das relações intermodais, de embarque e desembarque, por exemplo, como se daria o transbordo com linhas de ônibus? Como se daria a interação com os bicicletários - impossível não imaginar que este modal seja pensado com responsabilidade, a despeito das ciclofaixas e ciclovias existentes e péssima assessoria da TECTRAN;

5- O mundo ainda não adotou o aeromóvel, apesar de por meios de planejamento de médio e longo prazos ser possível em algumas especificidades, havendo soluções diversas em sistemas de transporte de massa por VLT, BRT, Metrô e Trens Urbanos. No caso do Brasil, para a resolução dos problemas de mobilidade urbana, diante dos grandes eventos planetários programados para o território brasileiro, com a Copa do Mundo e as Olimpíadas, foi eleito o BRT (sistema de grandes ônibus articulados com grande capacidade de usuários, em corredor exclusivo de circulação), devido a sua eficácia, economicidade e rapidez de execução, absorve entre 10.000 e 23.000 passageiros/ hora, conforme divulgação http://www.cbtu.gov.br/eventos/serie/portoalegre/07tendencias.pdf. Com este modal, nesta faixa de passageiros/hora, está o VLT, apesar deste em números totais ter capacidade maior, sendo outra grande alternativa para Campos;

6- A autorização de contração de empréstimos na ordem de R$ 439 milhões de reais, pela Câmara de Vereadores de Campos, coloca o Executivo em uma "fogueira", devido a todos os fatos registrados ultimamente, que demonstram sério descontrole nas contas públicas, além de dar possibilidade de implantação a um sistema de transporte em um corredor viário problemático, onde sequer a Prefeitura consegue coibir o tráfego de carroças tracionadas por animais;

7- A recente homologação do Edital de Concorrência do Transporte Público, não trouxe quaisquer alentos ao problema do transporte público, pois já em um primeiro momento, houve greve com paralisação dos ônibus, gerando grandes transtornos aos usuários. Como se não bastasse, os ônibus em circulação, não possuem por exemplo instalações de acessibilidade, o único terminal urbano rodoviário, é um improviso que expõe os usuários a todos os tipos de riscos a acidentes, desde a atropelamentos às quedas diversas. O aeromóvel da forma apresentada, não garante segurança;

8- Diante da recente homologação do Transporte Público, que não garante equacionamento dos problemas, pois ônibus não é sistema de transporte de massa, a liberação de linha de crédito do Fundecam de vultosos R$ 29 milhões de reais para que os vencedores do processo de concorrência de transporte renovem a suas frotas, soa como falta de compromisso e capacidade de investimento dos concorrentes e falta de autoridade pelo poder concedente. O município irá pagar juros financeiros dos empréstimos que supostamente as empresas  de ônibus irão contrair ao Fundecam de até 29 milhões de reais, sendo uma terrível premissa do que poderá acontecer com os volumosos R$ 439 milhões de reais liberados cordialmente pela Câmara dos Vereadores, sendo agravado por tratar-se de um sistema desconhecido em sua plena aplicação, carente de situações reais;

9- O projeto do aeromóvel não saiu do papel e em todos os tempos, desde que foi anunciado, há inequívoca prova de falta de planejamento, inclusive nesta última aparição, onde o percurso foi reduzido, sem justificativa plausível.

Por fim, como disse Jayme Lerner, "a falta de recursos é a mãe da criatividade", assim, parece-nos que os royalties, apesar de alimentarem outras esperanças e possibilidades se administrados de forma responsável, representam um grande mal, que nos impede a aplicação do que deu certo em Curitiba e que serve de parâmetro em todo o mundo, onde poderíamos fazer desta cidade um grande município através de soluções viáveis e adequadas aos problemas locais, que deveriam estar passando por debates públicos consensuais, para que não nos deixasse a sensação de estarmos sendo violentados por estupro, na ampla associação que o termo permite.

Decreto de desapropriação:

Renato César Arêas Siqueira
arquiteto e urbanista
perito técnico
professor bolsista UENF

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