TRE E PF INVESTIGAM TROCA DE BRINDES POR VOTOS NA CAMPANHA DE GAROTINHO
De O Globo deste domingo, 24/08/14 (aqui) e página 12 da versão impressa:
Em Campos, centro cultural de Garotinho distribuiu enxoval para bebês durante campanha eleitoral
TRE e PF investigam rede de distribuição, que inclui comunidades de Campos e do Rio
POR MAIÁ MENEZES E VERA ARAÚJO
24/08/2014 8:00 / ATUALIZADO 24/08/2014 8:56
RIO E CAMPOS DOS GOYTACAZES - Moradora de Caxias de Tócos, área agrícola e de extrema pobreza em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, Kíssila Henriques, de 29 anos, vive com o marido, ajudante de pedreiro, e seis filhos numa casa onde pássaros entram pelo vão entre o telhado e as paredes descascadas. O casal tem renda de cerca de R$ 800, juntando o que ele ganha com R$ 300 do Bolsa Família e R$ 200 do Cheque Cidadão, distribuído pela prefeitura de Campos. Mas o enxoval de Pedro Mateus, filho do casal, que nasceu prematuro em julho, foi um “presente” do Centro Cultural Anthony Garotinho, em Campos. O nome de Kíssila e a data da entrega do kit, 23 de julho, constam na listagem apreendida por fiscais do Tribunal Regional Eleitoral, há 10 dias, no centro criado para homenagear a história do candidato do PR e ex-governador.
Mães de seis filhos, Kissila Henriques, soube da distribuição do kit por uma funcionária do Centro de Saúde da Mulher, da prefeitura de Campos - Guito Moreto / O Globo
A apreensão foi um dos indícios da existência de um sistema de distribuição de benesses para a população de baixa renda, que ainda inclui 50 favelas da cidade do Rio. A rede foi montada por Garotinho por meio do programa que ele mesmo assume como seu, chamado de “Obra do Berço”, ligado à empresa Palavra de Paz, que inclui a produção de um programa de rádio, uma editora e até uma organização não governamental, a Missão de Paz. Na declaração de bens à Justiça Eleitoral, Garotinho declara, pela primeira vez, cota de R$ 116 mil da empresa. A coordenadora estadual da fiscalização, juíza Daniela Assumpção de Souza, já instaurou pelo menos três procedimentos contra a campanha do ex-governador. O alvo de um deles, cuja decisão foi dada em 14 de julho, era a oferta de brindes durante o “Fala, Garotinho” — programa de rádio agora apresentado pela prefeita de Campos, Rosinha Garotinho, mulher do candidato. A magistrada enfatizou o benefício eleitoral da distribuição de enxovais para bebês e levantou a questão da origem do dinheiro, que irrigou a pré-campanha do candidato ao governo do Rio. A pedido dela, a Polícia Federal já está investigando o caso. Os fiscais da Justiça Eleitoral foram recebidos no centro cultural por Elizabeth Correa Barreto e Ermilton Barreto, ambos filiados desde agosto do ano passado ao PR, partido do ex-governador.
Em sua sentença, Daniela Assumpção destacou: “O fato curioso é como o candidato consegue oferecer, em um programa, brindes que chegam a um sexto do valor de seu patrimônio declarado (de R$ 303.538,65)”. Ela referia-se ao sorteio de brindes que variavam de fogões, geladeiras e micro-ondas a rádios portáteis e TVs. O procurador regional eleitoral Paulo Roberto Bérenger disse que, em tese, práticas como essa podem ser enquadradas como abuso de poder econômico e que fornecimento de bens e serviços pode ser visto como compra de votos.
Tanto o material apreendido no centro cultural quanto um dos depoimentos dados ao GLOBO citam ainda a participação de ao menos uma servidora pública municipal na distribuição em Campos. Samara Soares Rodrigues foi nomeada no dia 4 de dezembro do ano passado pela prefeita de Campos, Rosinha Garotinho, como coordenadora do Centro de Referência e Assistência Social (Cras) da prefeitura, ligada à Secretaria de Família e Assistência Social da cidade — a mesma que distribui o Cheque Cidadão a 20 mil beneficiados. O valor passou de R$ 100 para R$ 200 em dezembro do ano passado. No centro cultural de Garotinho, foram encontradas guias de encaminhamento com a assinatura e o carimbo de Samara, o que a fiscalização entendeu como indício de ilícito eleitoral.
Grávida de cinco meses, Natália Frutuoso, de 25 anos, uma das que aparecem na listagem encontrada pela fiscalização do TRE, conta que soube da entrega dos enxovais quando foi atendida por Samara, no Cras da Esplanada, em Campos, para pedir apoio da assistência social no início da gestação. Ela ainda não recebeu o kit:
— Eu não sabia que tinha esse programa do enxoval. Foi a Samara quem falou comigo no Cras para procurar o centro cultural. Fui lá há um mês. Pediram para eu aguardar, pois eles dão o kit quando estiver perto de ele nascer.
Heleno de Souza Gomes, ex-marido de Danielle das Neves Coelho — que está grávida de oito meses do quinto filho —, confirmou que pegou o kit para ela no centro cultural. Danielle se separou há pouco tempo de Heleno. Segundo ele, ela ainda recebe o Bolsa Família, de origem federal, e o Cheque Cidadão.
Jaqueline Santos, grávida de 9 meses, conta que foi ao centro cultural de Garotinho por indicação de centro social da prefeitura - Guito Moreto / O Globo
Jaqueline Santos, de 29 anos, aos nove meses de gestação, afirma não ter sequer um chinelo para calçar, e está contando com o enxoval, que inclui fraldas, edredom, roupa de bebê e uma bolsa. Soube do cadastro por meio do Centro Social Urbano, da prefeitura de Campos, que disse para procurar “o centro cultural do Garotinho”.
— Eu não tenho nada. Moro de favor. Espero que ele (Garotinho) me dê essa ajuda. Meu voto será e sempre foi dele, porque ele ajuda as pessoas — diz ela.
O “Obra do Berço” também organiza “reuniões de orientação” em comunidades da cidade do Rio, como mostra a página da Palavra de Paz, que “fisicamente” funciona em um escritório na Glória, Zona Sul da cidade. De acordo com o site, a coordenadora do projeto é Tamara Lyz. A explicação sobre o funcionamento do programa não foi dada pela empresa. Cristiane Almeida, que se apresentou como “coordenadora executiva” de Garotinho, disse que, em uma reunião antes da convenção, o programa seria suspenso.
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— Sobre Campos, não sei o que dizer. Aqui no Rio, vou procurar a Tamara (Lyz) para ela explicar — diz Cristiane, que não retornou as ligações para dar mais explicações.
Tamara, mulher de Dumenil Eliodoro Modesto Filho, candidato a deputado estadual pelo PR, recusou-se a falar com O GLOBO. Procurada, disse que “não falaria por telefone”. Indagada sobre o horário para uma entrevista, afirmou que “verificaria na agenda”. Disse que não confirmaria se a distribuição dos kits permanece e se trabalha para a Palavra de Paz. No dia 17 de março, Garotinho postou em seu blog notícia sobre sua participação no lançamento da pré-candidatura de Dumenil a deputado, na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, Zona Norte do Rio.
A mulher de Dumenil é apontada por Rosângela Armando, de 60 anos, agente social na favela do Ascurra, no Cosme Velho, Zona Sul do Rio, como a pessoa que leva os kits para a comunidade. As duas teriam se conhecido por meio da Palavra de Paz.
No dia 18 de julho, Laurilene Oliveira dos Reis, de 33 anos, moradora do Cerro Corá, também no Cosme Velho, foi uma das agraciadas com o enxoval para o filho Arthur. Lá, Tamara é identificada por moradores como a distribuidora dos enxovais.
JUSTIÇA TRANSCREVE PROGRAMAS
Até junho, os pedidos para o recebimento de fraldas e cadeiras de rodas de ouvintes do programa “Fala, Garotinho”, transmitido pela Rádio Manchete AM, eram feitos ao e-mail garotinho@palavradepaz.com.br. Todo o trabalho filantrópico, de acordo com o site da Palavra de Paz, seria subsidiado pela venda de catálogos, Bíblias, CDs e DVDs por revendedores de todo o país.
Os últimos 30 programas de rádio de Garotinho estão sendo transcritos pela Secretaria do Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral, que também pediu as notas fiscais a Garotinho. A defesa do candidato, no entanto, vem protelando a entrega dos documentos.
Na sexta-feira, fiscais do TRE lacraram um galpão em São Cristóvão, Zona Norte do Rio, que armazenava propaganda irregular de Garotinho e de outros candidatos do PR. Foram encontrados também agendas, livros infantis, chinelos e outros produtos com o logotipo da empresa Palavra de Paz, além de três carros de som com propaganda dele.
GAROTINHO DIZ NÃO SABER DE DISTRIBUIÇÃO
O ex-governador Anthony Garotinho afirmou, na sexta-feira, que a distribuição do kit enxoval estaria sendo feita à sua revelia. E que desconhece que esteja ocorrendo:
— A determinação dada por mim é que, em período eleitoral, essa obra, que existe há 20 anos para fazer o bem a pessoas grávidas, seja suspensa.
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A prefeitura de Campos informou que “entendemos que este é um questionamento político e, como tal, não nos pronunciamos”, a respeito do suposto envolvimento de uma servidora no encaminhamento de grávidas ao centro cultural.
Garotinho confirmou que esteve com Dumenil Eliodoro Modesto, marido de Tamara Lyz, no dia do lançamento de sua pré-candidatura pelo PR, na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré. O ex-governador afirmou que os enxovais são “custeados pela Palavra de Paz, que ajuda asilos, clínicas para recuperação de dependentes químicos e trabalhos missionários, o braço social da empresa”.
O marido de Cristina Maria Aguiar foi buscar o enxoval no centro cultural de Garotinho - Guito Moreto / O Globo
Desde que o mundo é mundo os bandidos existem.
ResponderExcluirMas as leis foram criadas para prendê-los .
COMO O PRÓPRIO FALAVA NAS RÁDIOS; DO GOVERNO ANTERIOR VAMOS SORTIA COMO BRINDE UM PAR DE ALGEMAS PARA O ATUAL GOVERNO
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