sábado, agosto 09, 2014
DIA DOS PAIS
Já não me lembro, exatamente, quantos anos tinha, quando a professora anunciou que o tema da redação era sobre o dia dos pais. Meus colegas de primário do Barão de Macaúbas debruçaram sobre a folha e eu fiquei sem saber o que fazer. O meu pai morrera há pouco tempo e, com exceção do grupo escolar e da minha casa ali perto, tudo ainda era pra mim um imenso mistério. Sequer compreendia que os pais morriam e deixavam meninos sem saber como se defender.
“Escreva sobre as lembranças que você têm do seu pai”, tentou ajudar a professora. Não tinha tantas lembranças assim, a não ser a bicicleta de quadro duplo, a linha do trem por onde eu, a pé, levava a marmita dele, acompanhando um dos irmãos, um dia de chuva e aquele seu paletó que me vestia como se fosse uma batina. Isso dava uma redação? Deu uma poesia sentida e assimétrica. A primeira. Descobri, então, naquela manhã longínqua que eu tinha “um jeito de ver” a vida e seus desvãos.
A partir daí não parei mais de escrever. Cumpro a sina dos que varam a vida imitando Deus, inventando de novo o Mundo, a partir da palavra encantada. Por obra e graça do meu pai, de nome difícil, Anleifer – anagrama do nome do seu pai, Antonio Leite Fernandes. Foi sua memória que escavou o túnel da Poesia em mim.
No próximo dia 20, ele completaria 100 anos. Anleifer, ou Fefê para os amigos. Um guarda florestal, um intelectual autodidata, um amante e leitor do romance brasileiro que partiu muito cedo, mas deixou sua prole aos cuidados de uma grande mulher, Dona Djanira, sua companheira definitiva. Nossa mãe absoluta!
(FLF)
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