CHAME O LADRÃO
Era
inevitável.
A crise de
proporções oceânicas que engolfou o Brasil, nos últimos tempos, alimentada pela
rapinagem estatal, sem paralelos na história contemporânea, derrubou mitos,
forjou idiossincrasias nefastas, estilhaçou o código moral, instaurou a
cleptocracia, inventou e disseminou a cultura da esperteza desonesta.
Mas ainda
mais grave que tudo, converteu a pacata
sociedade brasileira numa turba insaciável por vingança, quando o ideal
era aguçar seu senso de justiça. Não basta mais o castigo que deveria corrigir
condutas ilícitas. A privação da liberdade, maior de todos os bens do homem, banalizou-se
e nas escadas frontais do terceiro milênio, ecoa surdo o grito das ruas por
cada cabeça coroada presa e exposta na mídia, mais faminta e mais voraz. É a
versão high tec da lendária guilhotina.
Por incrível
que possa parecer, vivemos alguns séculos, nesta abençoada Ilha de Vera Cruz
com suas mais delirantes contradições. A descoberta da terra, a consequente
posse e a extinção quase completa dos índios; o Império devasso de Dom Pedro I
e a unidade do país, à despeito das investidas mercenárias; a tardia abolição
da escravatura, a controvertida república, fatos que moldaram uma sociedade
desigual, “tudo tão desigual”.
Contudo,
havia uma certa harmonia na desordem social. Os ricos, aparentemente, conviviam
com o medo que, um dia, os pobres descessem os morros e tomassem de assalto o
asfalto. A Ciência Social também formulava esta tese. Mas, qual, o que se
revelou, no meio nessa pilhagem dos colarinhos brancos, o verdadeiro perigo, a
ameaça real é que os pobres são os que devem temer que esses janotas do crime
resolvam subir os morros.
(FLF)
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